Meu colega da “Folha”, Mário Magalhães – autor da excelente biografia “Marighella”, que recomendo demais – escreveu um texto muito interessante em seu blog na última sexta-feira (leia aqui), com o título “Quem não gosta de partido é ditadura. Hora de escolher: ou dar as mãos aos skinheads neonazistas ou abraçar a tolerância e a democracia”.
Mário criticou a reação de alguns manifestantes que, nos protestos de quinta-feira, reagiram com violência à presença de integrantes de partidos políticos e sindicatos: “No país inteiro, militantes portando bandeiras, estandartes e símbolos de partidos políticos, centrais sindicais, entidades estudantis e movimentos sociais foram escorraçados por uma turba intolerante. Em São Paulo, os principais executores dessa modalidade de repressão política foram os skinheads, os ‘carecas’ neonazistas. Botaram para correr quem vestia camisa vermelha, rasgaram bandeiras de agremiações e arrancaram faixa do movimento negro. São racistas e homofóbicos. No Rio, essa turma agride, fere e mata gays.”
Nesse ponto, concordo inteiramente com o Mário: todo mundo tem o direito de se manifestar, inclusive os partidos, sindicatos, uniões estudantis, etc. Os protestos não são “território” de ninguém.
Mais preocupante que o fato de skinheads terem reagido assim – esse é, infelizmente, o modus operandi desses boçais, que precisam ser combatidos – foi o fato de pessoas que não são skinheads ou ligadas a grupos extremistas terem agido da mesma forma. Houve uma clara rejeição à presença de partidos e sindicatos nas manifestações, que não partiu só de skinheads.
O pior é que muita gente aplaudiu e apoiou essas reações violentas. Parece existir uma preocupação grande – quase uma obsessão – em não partidarizar os protestos.
Acho que está havendo uma confusão grande em relação a esse tema.
As pessoas parecem estar confundido “apartidarismo” e “antipartidarismo”. São duas coisas bem diferentes.
Pessoalmente, acho ótimo que os protestos sejam apartidários, mas não posso concordar que sejam antipartidários. Defender manifestações gregárias e inclusivas não significa escorraçar quem pensa diferente de você.
O ideal seria que os protestos mantivessem um caráter apartidário e inclusivo, mas que deixassem os participantes se manifestarem da forma que bem entendessem.
Como bem disse Mário, manifestações populares importantes da história do Brasil tiveram a presença de diversos partidos. Eu estava na Presidente Vargas – com meu pai – em abril de 1984, no famoso comício das Diretas, e vi Lula, Ulysses Guimarães, Fernando Henrique Cardoso, Brizola, Quércia, Tancredo e muitos outros dividindo o palanque. Bandeiras do PT, PDT e PMDB tremulavam lado a lado.
Acho perigoso comparar períodos históricos. Naquela época, partidos eram bem mais importantes e tinham mais representatividade que hoje. Quem diria que, 30 anos depois da campanha pelas Diretas, Lula estaria de braços dados com Maluf e Sarney, e os tucanos seriam aliados do Democratas, partido que nasceu do PFL e que, por sua vez, nasceu do PDS?
“Coisas da política”, claro. Mas são exatamente essas “coisas da política” que estão minando a credibilidade de partidos.
Voltando aos protestos recentes: não acredito que seja possível – ou desejável – manter as manifestações livres de partidarismo. Mudanças, se é que vão ocorrer, precisam passar por eles. Muito mais importante que rechaçar a presença de partidos é votar bem, para que eles voltem a ter representatividade.